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Era de manhã quando me dei conta de que permanecia ali na mesma cama fria. Fazia 8°C aproximadamente lá fora e um estranho com os cabelos d...

Estou


Era de manhã quando me dei conta de que permanecia ali na mesma cama fria.
Fazia 8°C aproximadamente lá fora e um estranho com os cabelos desgrenhados estava roncando ao meu lado esquerdo, de bruços, parcialmente nu.
Eu sabia quem era, ou melhor, não sabia. Sabia seu nome e no máximo o tamanho de seu pênis - não muito grande - e que durante o sexo adorava dizer – ‘mais... Isso! Mais... Isso!!’.
Nada mais que isso.
Mais uma conquista de quinta-feira à noite.
Recordo-me com exatidão dos copos, das luzes dos bares e do maço de cigarros tragado em menos de 2 horas.
Olhei atentamente para o garoto em questão. Loiro, magro, um pouco mais baixo que eu, pele clara, com poucas marcas de espinha do passado mal tratadas. Não era nem um modelo excepcional e também nenhum trasgo. Era bonito.
Levantei-me e me dei conta que estava apenas de shorts listrado, preto e branco. Mais nada.
Procurei a esmo uma camisa em meio à parcial escuridão do quarto gélido. Encontrei jogada ao pé da cama de solteiro em que estava uma pólo branca, amarrotada que se perdia em meio a uma embalagem vazia de camisinha aromática e pares de tênis e suas meias sujas no chão bagunçado.
Vesti-a e sai cautelosamente do quarto rumo ao banheiro.
Enquanto mijava, encarava o teto do banheiro com paredes descascadas pensando na vida.
Estava prestes a completar 25 anos de idade. Muitos me amando, muitos me odiando. E eu dividido entre a cruz e a espada.
Sem querer pensar, fodendo um cara diferente a cada semana, fumando descontroladamente e delirando, apenas para sentir o limite da porra da vida em que eu me metera.
O passado me trouxe conseqüências tais, que já não sabia mais qual seria meu futuro.
Não que eu esperasse ou almejasse um. Não, isso não. Apenas trabalhava e estudava para suprir minhas necessidades primarias – sexo, boa comida, boas roupas, musicas e filmes -; o resto não me importava.
Era o imediato, o aqui e agora que me acrescentava e não projeções que nem eu e nem ninguém eram capazes de adivinhar ou mesmo evitar ou prever.
O que me incomodava era aquele vazio. Aquela sensação de fome eterna, de desconforto. Mil pensamentos num segundo, sonhos e pesadelos se misturando. Engorda, emagrece, perde o sono e a sensação de ter que decidir, de ser culpado, mas não querer se sentir um.
Estava, aos poucos, ficando completamente louco.
“Porra! Tenho apenas 25 anos. 25!” – pensava com amargura cerrando os olhos.
De volta ao quarto o guri já estava sentado me esperando. Completamente nu, em posição de cachorro, me olhando enviesado, se oferecendo para mais uma foda sem limites e matinal.
Olhei e sorri.
Aproximei-me da cama, retirando meu pênis ereto de dentro do short...

Eram 5 da tarde quando ele resolveu que tinha que ir embora. Antes me deu seu telefone e pediu que eu ligasse para ele naquele final de semana.
Prometi ligar, me despedi beijando-o na boca e voltei para a sala, deixando meu celular em cima da mesa da sala de estar - o visor mostrava a mensagem: “numero deletado”.
Parado em frente à TV desligada, de súbito me veio uma vontade louca de ler. Qualquer coisa. Com urgência.
Rumei de volta ao quarto em pleno caos e liguei o computador.
Assim que este deu sinal de vida, acessei alguns blogs que a tempos deixara salvo nos favoritos mas nunca arranjei tempo para conferir.
Alguns falavam de violência contra a mulher, outros sobre política gay e ainda outros tantos de musica, filmes e um interessante sobre novas mídias digitais.
Mas eram quatro blogs distintos que me chamaram a atenção.
Um falava de morte; o outro de amor, o outro de paixões e um outro de vida.
Pode parecer que nenhum deles continha grande conteúdo (temas batidos, clichês). Mas sim, havia.
Pois cada um continha uma única postagem.

- o da morte dizia:

O medo da morte é algo inexistente. Pois o que se teme não é a morte certa enfim. E sim o desconhecimento. O desconhecido causa medo, receio e insegurança.
A morte é apenas a aventura... A grande aventura seguinte.
Ha coisas piores que a morte.

- o da vida dizia o seguinte:
A vida é redonda. Tudo que vai volta. Não igual.
Muitas vezes aquilo que se perde muda, se transforma. Mas o que é certo é que sempre volta. Uma frase, um ato, um amor... Sempre voltam. Tudo é cíclico. A terra gira, a vida gira.
- o do amor falava:
Amor é tudo aquilo que existe.Amor é mais que sexo, é mais que pai e mãe.
Amor é dor, amor é briga, amor é discussão, amor é tristeza, amor é redenção, amor é duvida, amor é ciúmes e medo.
Amor é aquele que sempre nos faz rir. Amor é aquele que sempre nos faz pensar. Amor é aquele que ao pensar em sua partida, perdemos a nos mesmos também, sem imaginar como seria depois dessa ida. Amor é aquele que procuramos nas horas de desespero.Amor é amor. Sem definição, sem explicação. Amor é aquilo que tememos perder, que não sabemos lidar, que queremos sempre ter e que nunca procuramos obter. Amor não se conquista, amor se tem e só. Sem razão e com toda a razão.
- e o da paixão dizia assim:
Paixão é conquista. É orgulho ferido. É satisfação momentânea, é dizer sou capaz sem falar.Paixão é luxuria sexo e porto seguro.Paixão é o que acrescenta para outra paixão surgir.Paixão é aquilo que achamos que não podemos ter, ou que já temos, mas não é fácil. É aquilo que queremos e por isso corremos atrás.Paixão é sensação de calmaria, desafio confundido com amor, vida e alegria. Paixão é o destino, paixão é a escolha, paixão é o que tem inicio e fim. Paixão vive no meio. Paixão é sempre sim. Paixão é imediatismo, é vírus mutável, é desejar sinônimo de querer fazer. Paixão não é errada, mas não pode pra sempre conviver e ser conservada.

Extasiado pelos quatro blogs, pelos quatro textos, fiquei parado, sem saber nem mesmo como se respirava.
Faltou o ar, a boca secou. Levantei, abri as janelas e arfei com dificuldade e gosto o ar gelado que assolava do peitoril minha face preocupada. Era a paixão.
Olhei de lá mesmo a vista do céu nublado, porem, algumas poucas tímidas estrelas azuis sorriam dengosas a meu olhar. Sorri de volta e me servi de um gole d’água que esquecera ali na cômoda mais cedo.
Respiração normalizada. Voltei para frente do computador.
Encarando as quatro janelas ainda abertas dos quatro blogs, me pus a chorar diante dos fatos, das lembranças, das letras, das musicas e dos lugares e épocas, conversas e gestos que me lembravam de tudo o que ainda vivia.
‘Realmente a vida era redonda. Porque precisava voltar? Porque não podia ser tudo como as mares, as cachoeiras. Um fluxo continuo sem volta... Seguindo sempre em frente?
Mas na realidade nem mesmo as mares eram assim. Pois elas continham ondas que buscavam na praia suas lembranças de volta ao lar em movimentos contínuos, sempre. ’
Era a vida sendo-me apresentada finalmente.
Uma musica alta começa a ecoar em volta e me assusto.
Saio de meus devaneios filosóficos e tento escutar com mais atenção.
Logo percebo a origem do som.
Meu celular tocava estridente no cômodo abaixo, esquecido em cima da mesa da sala de estar.
Seguindo o som agridoce, rumei ate as escadas para buscar o celular e desligá-lo – não queria falar com ninguém.
Um passo em falso e caio.
Mais de 30 lances de escadas e quase um pescoço quebrado ao chocar-me contra o sofá reencostado diante da escada de metal.
Com o pulso acelerado me assusto pelas conseqüências que aquele passo errado quase me causara. Poderia ter morrido ali, sozinho, sem ninguém saber. Numa pós foda com um desconhecido, cheirando a cigarro e o nariz entupido de pó barato.
Mas o interessante era que a morte em si era ate agradável naquelas condições – não mais pensar, não mais desejar, não mais trabalhar, não mais respirar, sem dores, sem decepções, sem magoas- o nada, o vazio...
Não, o que me fez temer a merda que poderia ter ocorrido, era a falta que eu sentiria de algumas pessoas. Não, não a falta que eu sentiria - afinal eu não mais sentiria nada (era o que eu esperava) - mas sim, a falta que eu causaria a algumas pessoas. Por um segundo, com o celular ainda tocando insistentemente nas mãos, pensei na vida sem minha mãe, sem minha família, sem determinados amigos e sem ele... Sem ele... O que seria pra ele viver sem...
E de repente percebi. Era a morte se fazendo entender e adquirindo respeito mutuo num igual. E o amor se revelando enfim. No que é simplesmente por ser.
Era estranho aceitar e entender assim, mas era.
- Alô!- disse ao atender o celular meio estagnado e arfando.
No telefone era engano, alguém chamada Elza, procurando uma tal de Claudia.
E eu, dessa vez sem meias, descalço e segurando firmemente no corrimão de metal gelado, voltei pro quarto. Onde me tranquei, apaguei a luz, desliguei o computador e fechei a janela, para me emaranhar nos lençóis ainda amarrotados da minha cama de solteiro, pronto para sonhar com um show de rock, numa rua repleta de diversidade saboreando uma valsa de chocolates...
Eu ainda estava vivo. Estou...


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Um comentário:

  1. Bom, eu acho q quem ligou foi a morte... Mas qdo ela viu q vc atendeu, fingiu que era engano.
    Ela adora enganar.

    Adorei...

    Suas influencias são as minhas e é fácil me identificar... mas o mais fodão é que eu percebo vc nas suas próprias influencias...

    Me gustas tu...

    ResponderExcluir

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